terça-feira, junho 18, 2013

(in)completa 3

Oito andores à minha frente cheios de flores, pesados. Um mar de gente por todos os lados com roupas novas e óculos de sol. Está calor. Vou debaixo do pálio. Mas o calor insiste em entrar por debaixo da sombra, por debaixo da alva e da estola. Uma banda filarmónica faz por abafar o barulho que a multidão faz. É festa. A festa de um santo que agora não me lembra, porque são muitos os santos que vão nos andores. É festa porque o barulho é de festa. A multidão ri, conversa como se estivesse na rua e está, atende telemóveis, faz da procissão uma feira de pessoas que no aparato da coisa esquece que uma procissão não é bem uma feira. São assim as nossas festas religiosas. E ali vai um padre atrás de oito andores…

Se queres ser tu a decidir o rumo desta história, então o "(in)completa 3" é para ti. Tens oportunidade de imaginar o final do texto e seres o seu autor. O melhor final será publicado como post. As regras são simples:
  1. Para participar, deves enviar o teu texto como "coment"
  2. deves dar um nome ao texto (com maiúsculas)
  3. deves repetir a última frase na íntegra, retirando as reticências.
  4. deves assinar no final, mesmo que seja com pseudónimo
  5. deves esforçar-te por não alongar muito o texto (no máximo 600 caracteres, isto é, cerca de 125 palavras)
  6. deves respeitar o espírito e personalidade do "Confessionário dum Padre"
  7. se o texto for, de alguma forma, abusivo, não será publicado
  8. podes participar com o máximo de 3 textos

N.B. Também poderás comentar nos coments os textos dos participantes.

quinta-feira, junho 13, 2013

A Igreja da senhora Alcinda

A senhora Alcinda ia escorreita pela calçada, evitando as pedras mais altas, como se de um jogo do pé-coxinho se tratasse. Passou por mim distraída. Dirigi-lhe o meu Boa Tarde, e parou para me olhar e me cumprimentar. Então onde vai tão apressada, perguntei. E ela respondeu que ia a caminho da igreja, tal como eu, para a missa. Quase de braço dado, foi o que fizemos. E no meio da caminhada para a igreja, ocorreu-me perguntar-lhe se sabia o que era a Igreja. A pergunta foi apresentada de forma inocente e ela respondeu de forma igual. Então, senhor padre, não é para lá que vamos, para a nossa igrejinha de Santo António? E assim aproveitei para lhe ensinar algo que ou já se tinha esquecido ou não sabia mesmo ou não dava importância. Olhe que a Igreja não são estas quatro paredes que dedicámos a Santo António. Lá veio ela de novo com o Então, pois gosta de começar assim as frases. Então são os senhores padres a Igreja. Ia interrompe-la quando acrescentou Ai, e o Papa, pois claro. Bom, e então é que me saiu uma ensaboadela de eclesiologia. Ora bem, assim como não é, como a comunicação social costuma dizer, o Papa ou quem está à frente da Igreja, padres ou afins, assim também não são as quatro paredes de Santo António. Ainda pensei em falar-lhe do Concílio Vaticano II, mas como para ela deviam ser alhos e bogalhos, e como já estávamos para entrar nas ditas quatro paredes, disse-lhe mais ou menos o seguinte. A Igreja somos nós, senhora Alcinda. Somos nós os que nos reunimos nestas quatro paredes. Sou eu, que sou padre, e é a senhora Alcinda, e todos os outros. Só faz sentido que assim seja. A minha missão dentro da Igreja é diferente da sua, mas todos fazemos a verdadeira Igreja de Cristo, do qual Ele é a cabeça e nós os membros. E entrámos na igreja de Santo António. Um dia destes tenho de falar de novo destas coisas na homilia. Ainda há gente que confunde a Igreja com paredes e seus ministros.

quinta-feira, junho 06, 2013

Os ordenados dos padres

Um jovem de idade mais parecida com a minha do que com a dos jovens no vigor da idade, dizia-me em conversa, com uma certa admiração para comigo e que me deixou admirado com ele, que eu devia receber muito dinheiro. Não o disse como quem perguntasse ou desdenhasse, mas para afirmar que eu merecia um enorme ordenado, dado que o que fazia dava sempre algum fruto, ou de outra forma, onde tocava, algo de bom acontecia. Foi esta a explicação que me deu. Claro que fui para casa preenchido, como se não houvesse um cantinho em mim onde pudessem caber outras coisas, sobretudo as minhas fragilidades. Umas horas mais tarde, em conversa telefónica com um colega, assim como quem não quer a coisa, mas até quer, contei-lhe o sucedido. Este respondeu-me da seguinte forma, que me deixou com um espaço enorme para preencher com as minhas fragilidades. O que fazes, fazes a pensar em ti ou para ti, ou em Deus e para Deus? Eu esclareci-lhe que era em Deus, ou que às vezes era o que tinha de ser feito. E ele acrescentou. É que se fazes as coisas a pensar em ti, deverias receber muito mais dinheiro. Mas se as fazes a pensar em Deus, até o que recebes é demais.