quarta-feira, outubro 02, 2013

Casamento não tem custo

Noivo comum, jovem e mais ou menos despachado. Vive há uns dois anos com a futura esposa. Lugar-comum. Vai casar para lhe fazer a vontade. Trataram dos papéis, dos processos civil e religioso. Na hora das contas, revelou um jeito desconfiado. Há uma licença para pagar, informo. Ele responde que um amigo casou há pouco tempo e não pagou nada. Acho estranho e pergunto se ele casou realmente pela Igreja, pois não era possível casar sem a licença. Alguém lha deve ter pago, acrescento. Que era o correspondente ao processo civil que custou uns 150 euros e que esta licença religiosa era apenas uns 20 euros. Comparação feita, e ainda não estava desfeita a má ou pouca vontade do noivo. Expliquei que paguei do meu bolso por adiantado, evitando que tivessem de fazer uma deslocação a fim de tratarem do assunto na Curia, o equivalente à Conservatória do Civil. Repare-se que nem abordámos os possíveis, ou plausíveis, ou adequados, ou desejáveis pagamentos do trabalho da cerimónia. Ele achava que não devia pagar nada. E até certo ponto tinha razão, pois as coisas de Deus não deviam ter custos. Ou melhor, não têm custos. Porém, ninguém vive do ar. Pode viver da generosidade, mas não do ar. Além disso, uma coisa é presidir a um casamento de graça, e outra ter de pagar para o presidir. E às tantas acabei por lhe insinuar, com alguma maldade, reconheço, que iria fazer uma pergunta, mas que era melhor não me atrever a fazer, mas que acabei por fazer, perguntando sobre custos com flores, grupos corais a propósito ou despropósito, fotógrafos, boda e similares. É que às vezes parece que a cerimónia do casamento, que é o centro da festa, é apenas o irmão menor da mesma.
O jovem noivo acabou por perceber e pagou. Penso eu. De facto pagou. Mas para ser sincero, eu gostava de não ter tido aquele tipo de conversa. Não gostei de lhe pedir dinheiro. Não gostei de sentir a tal má vontade, que me pareceu desajustada. Não gostei de ter feito a insinuação que fiz. Gostava que o mundo, a Igreja e as pessoas fossem diferentes, e que estas coisas não fossem sequer assunto.

13 comentários:

Anónimo disse...

As coisas de Deus não deveriam ter preço, Padre. E quem sabe se não tivessem obrigação as pessoas contribuíssem de forma bem mais generosa.

Vou-lhe fazer uma confidência: deixei de comprar missas. Vou, participo na celebração, rezo. E dou mas quando quero, o que quero e a quem quero.

Percebo na perfeição esse episódio. Podia muito bem ter-se passado comigo.

Anónimo disse...

Sugestão:

Na Alemanha, casa cidadão é obrigado a declarar qual é sua confissão religiosa. Mediante isso, o estado cobra-lhe uma importância determinada para entregar a essa confissão religiosa. Cada "sacerdote" aufere um soldo pessoal. E as despesas do culto também saem desse tributo colectado.

A coisa mais desagradável e dissonante é ver a luta dos párocos para se sustentarem...o que é legítimo, em certa medida. Mas, é uma atitude que embacia o múnus...

Ana Melo disse...

Criamos um tipo de vida, uns mais que outros, em que é o dinheiro que comanda. Na fé devemos continuar a não valorizar, se tem dinheiro paga, se não tem não paga, se compreende paga, se não compreende não paga, (não me apetece pensar na longa maquina/organização por detrás do padre). Há sempre gente, a maioria, que compreende. Há sempre gente, que paga em dobro. Não devia ser preciso explicar, mas sendo preciso, não faltam argumentos verdadeiros, as deslocações, os combustíveis, a luz, a água, os detergentes, a manutenção da igreja e do alojamento paroquial. Também a pergunta óbvia, do que se vai alimentando o padre!?, como compra o carro em que se desloca!?. Toda esta explicação fará com que o “ mal informado” deixe de pensar na fé como qualquer coisa extraterrestre, quem sabe! não esteja aqui, o Tal abrir de olhos, para a misericórdia para a caridade. Também o argumento, de que uma pessoa, um de nós, em mais dificuldade, é muitas vezes num padre que faz um primeiro desabafo, e que pode ser preciso nessa hora, responder à urgência, (!!urgências!! de uma garrafa de gaz! para poder cozer um arroz que também já veio dado, de outro local, qualquer!!), pois a maioria de nós acha que essas urgências existem!! mas, muito looonge!!! NUNCA NA NOSSA VIZINHANÇA!, POIS AS PESSOAS CONTINUAM A SAIR Á RUA BEM VESTIDAS!!!!

É a vida! é a Cruz! Já falamos disto em outros posts! (Uns mais do que outros! todos temos de nos vender um pouco!)

Unknown disse...

Pois, Padre, acho que há vários aspectos a encarar neste acontecimento.
Para começar o noivo não teria vontade de se casar e muito menos na Igreja e, quando há má vontade, tudo serve para tentar descartar a situação.
Por outro lado, em que mundo vive para imaginar que algo não tem custos?
É evidente que o ideal seria o custo zero mas, a par do sacramento, há muitas outras despesas que é necessário pagar, umas inerentes à administração do sacramento e outras nem tanto. Mas querer uma cerihónia bonita e não querer dar nenhum contributo é, no mínimo, despropositado.
Parece-me,até, que o sacramento em si pouco ou nada lhe dirá e, nestes casos, penso que deverá haver coerência não celebrando aquilo em que não se acredita.
Um abraço
Ruth

Anónimo disse...

Apesar de achar que as coisas de Deus não devem ter custos, não posso deixar de recordar que as coisas de Deus têm um custo que nem se consegue contabilizar!

Por isso, e se gastamos tanto com outras coisas, porque não havíamos de, ao menos, ser generosos!?

Anónimo disse...

Quem paga adiantado pode ficar mal servido presidindo ou não.
Colocou maldade na insinuação e isso aborrece-o. Porque não disse exactamente o mesmo numa atitude educativa e generosa? A boca fala do que abunda no coração…
Que tal começar a diferença por si?

Anónimo disse...

Anónimo 04 Outubro, 2013 06:50
Isso pode ser contestado pelo cidadão tornando-se não obrigatório o seu pagamento. Essa medida é obviamente absurda.

Anónimo disse...

Embora quase sempre discorde das argumentações de Ruth, pareceu-me pertinente a abordagem ao noivo da coerência do seu matrimónio cristão, sob o risco dele desistir ali mesmo se abordado de maneira inadequada.

Confessionário disse...

Anónimo de 05 Outubro, 2013 21:19

Eu disse-o e fi-lo numa atitude educativa e generosa (não sabes quanto!), mas mesmo assim incomodou-me. Aliás, incomoda-me sempre quando tenho de falar de pagamentos às pessoas!
Preferia que ele tivesse perguntado quanto era, eu explicava-lhe todo o procedimento... e pronto!

De qualquer forma, e já agora, façam esse exercício de somar o que os noivos gastam com coisas que não são o centro da festa e por outro lado o que gastam com o centro da festa! A diferença é assustadora.

Anónimo disse...

São as pessoas que não perguntam simplesmente "quanto é" que acabam por nos interpelar, nos fazer pensar... Por outro lado, ainda mais importante, é uma oportunidade que tem para mudar o ponto de vista de quem assim se lhe apresenta. Qualquer motivo pode ser bom, para mudarmos alguém para melhor.

Não é preciso exercitar muito a mente para perceber que o valor gasto com o menos importante é sempre muito superior. Difícil para um padre perceber a inversão de valores.
Quando fui ver a beleza do quadro de Mona Lisa ao Louvre, nem todos o pudemos ver ao mesmo tempo. Assim se passa com Deus, o sr padre viu primeiro, esse há-de ver depois. O padre não é melhor que ele por isso, nem mais justo...

O dinheiro deve ser por nós pedido com a mesma simplicidade e facilidade com que é dado. Há tempo para pedir e tempo para dar. Afinal o Sr padre é gestor dos seus talentos e as contas maiores que tem de prestar são a Deus. Se é para Ele que gere e não para os homens, não lhe deve perturbar ter de pedir. Se eu não pedir a quem me deve, não tenho para dar a quem não tem.

Anónimo disse...

Caro Confessionário

Esta sociedade, da qual eu faço parte, paga pelo que se mostra... paga-se a camisola que tem o logotipo 'xpto' e que foi confeccionada num edifício qualquer do Paquistão por inocentes e calejadas mãos de crianças que nunca brincaram com outras crianças... pagam-se os arranjos florais (os corais e demais ostentações bonitas aos olhares agnósticos e ateus) para o serviço religioso cujas palavras pouco importam porque evocam valores que já não cabem na vida vazia das pessoas...

Nunca é demais lembrar que numa sociedade marcada pelo imediatismo e pela comunicação fácil o "ter" se sobrepôs há já muito ao verdadeiro "ser".
Abraço fraterno. AM

Anónimo disse...

Que engraçado.
Existe mesmo uma licença?
Na Igreja onde Baptizei a minha filha (que não paguei nada) conheci uma rapariga que se casou lá e também não pagou nada.
Sempre achei que isso variava de Igreja para Igreja, pois o valor que pedem numa nunca é igual ao da outra.

Confessionário disse...

Olá, ultimo/a anonimo/a
- sim, existe uma licença a pagar na Curia (similar à Conservatória do Registo Civil), e embora os preços das cerimónias possam variar de paróquia para paróquia, e até possa haver quem não pague nada, a licença é um documento sem o qual não pode casar religiosamente pela Igreja Católica, e este paga-se.
- já agora, para o batismo só é precisa licença se for realizado numa paróquia que não a da pessoa que vai batizar e tb se paga na tal Curia
- o resto de pagamentos depende da organização económica e administrativa das paróquias... e tb da generosidade das pessoas

ab